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Opinião Domingo, 12 de Março de 2023, 18:15 - A | A

Domingo, 12 de Março de 2023, 18h:15 - A | A

Opinião

Às mulheres, essas misteriosas e divinais criaturas

Por Percival Puggina*

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Hoje é o Dia Internacional da Mulher. A crônica que segue tem a pretensão de as homenagear ajudando os homens a melhor entendê-las. Difícil minha tarefa? Certamente. Afinal, lido com a maior beleza da Criação e nosso maior fascínio ao longo da vida. Ao mesmo tempo, sei que o encanto feminino passa pelas diferenças anatômicas e vai muito além. Quebrar a casca grossa da insensibilidade masculina, que tanto confundimos com a condição de macho da espécie, possibilita mergulhar na essência dessas desigualdades. Uma vida mais feliz e o acesso a aprazível catálogo de experiências existenciais abrem-se então.

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Percival Puggina

Percival Puggina

 

Conto um fato que me descortinou esse conhecimento. Aconteceu por volta do ano de 1980. Naquela época, tínhamos um carro só e três filhos pequenos. Para dedicar-se a eles, Mariza deixara seu trabalho como professora e assumiu a tarefa diária de me levar e buscar no escritório. Chegando ao carro, eu assumia a condução.
 
Nesse dia, nossa caçula, Mariana, com seus três anos, me esperava de pé, no banco traseiro, com o corpo projetado sobre o encosto do banco onde eu iria sentar. Em movimentos simultâneos, beijei-a, sentei-me e fechei a porta. Ouvi um grito de dor seguido de um choro convulso. Enquanto, em pânico, reabria a maldita porta, pensei nos dedinhos da minha filha espremidos contra a lataria e assumi todas as culpas, remorsos e penitências do universo. Um segundo depois, vi que ela voltara a sentar e que sua mãozinha não estivera no batente da porta. O motivo do choro era outro e continuava.
 
Até hoje, passado quase meio século, sempre que lembro aqueles instantes de agonia, seguidos de infinita gratidão a Deus, meus olhos se enchem de lágrimas. Enquanto o pranto de dor seguiu convulso, Mariza me explicou, num murmúrio: “Levei-a ao salão onde cortou o cabelo. Ela quis te exibir o cabelo cortado e tu não reparaste, Percival”.
 
Três aninhos, marmanjos que me leem! Três aninhos tinha minha filha quando me transmitiu essa peculiar lição sobre a alma feminina, e esses exóticos anseios, tão naturais para as mulheres, mas tão inescrutáveis por nós.
 
Que neste 8 de março elas recolham nosso pedido de perdão por todas as flores que não lhes demos, pelos elogios que julgamos desnecessários, pela atenção que lhes recusamos, pelos versos que não fizemos, pelos afagos que não lhes proporcionamos. A todas, ninhos da humanidade e maravilhas da natureza, minha sempre encantada admiração.

 

 

*Percival Puggina (78)
Membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

 

Nota: Pouco depois do fato aqui relatado, eu escrevi para o Correio do Povo uma crônica a respeito. Não havia computador à época, por isso o texto não está na infatigável memória do PC. Tampouco o achamos, Mariza e eu, revirando duas caixas cheias com centenas de recortes de jornais do século passado. Queria reproduzir, aqui, o que escrevi a respeito quando jovem. Na falta, vai este, redigido com o peso dos anos. Se alguém tiver o texto antigo fará grande bem me enviando uma cópia.

 

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