Entre 1985 e 2020, Mato Grosso do Sul teve reduzida de 1,3 milhão de hectares para 589 mil a área permanentemente coberta por água.
Os últimos dias têm trazido notícias extremamente preocupantes sobre o meio ambiente de Mato Grosso do Sul e, com teor ainda mais grave e urgente, sobre o bioma pantaneiro em especial.
Até o último dia 20 o fogo já havia atingido 261,8 mil hectares do Pantanal, área superior aos 248,5 mil hectares que correspondem à média de queimadas de janeiro a agosto nos últimos anos. Em 2020, ano em que a região enfrentou as piores queimadas da história, a área devastada no período foi de 1,3 milhão de hectares. Ao final da trágica temporada, o Pantanal havia perdido 3,9 milhões para as chamas.
Porém, se a área queimada até agora é bem menor que aquela devastada no mesmo período do ano passado, em muitos casos o fogo está atingindo regiões que mal começavam a se regenerar depois de serem queimadas em 2020.
E há uma informação ainda mais perturbadora: em apenas 36 anos Mato Grosso do Sul perdeu nada menos que 57% da água de superfície, que foi reduzida de 1,3 milhão para pouco menos de 600 mil hectares entre 1985 e 2020. O que coloca nosso estado na liderança de um trágico ranking, projetando um cenário alarmante, uma vez que nada sugere que vamos ser capazes de reverter as causas que fizeram evaporar, de forma definitiva, a água que cobria aproximadamente 700 mil hectares.
Com relação às queimadas no Pantanal, ainda que não esteja no horizonte a previsão de que a tragédia do ano passado se repita agora, nas mesmas proporções, o que temos visto até aqui não permite qualquer otimismo. Embora tenha sido registrado um número menor de focos de incêndio neste mês em relação a agosto do ano passado, o pior mês para propagação do fogo na região tem sido setembro, segundo os especialistas.
Esses mesmos estudiosos apontam que neste ano o Pantanal secou de forma bem mais rápida, o que pode alterar seriamente o panorama que até julho – quando ocorreram 56% menos focos de calor que no mesmo período do ano passado – era considerado mais ou menos tranquilo. Com isso, o mês de setembro é aguardado com muita apreensão em nosso estado. Até porque, ao contrário do que ocorreu em 2020, quando os incêndios se alastraram primeiro no Pantanal de Mato Grosso, neste ano é na parte sul-mato-grossense da planície pantaneira onde tem ocorrido queimadas mais severas.
Assim, enquanto nos defrontamos, mais uma vez, com o drama que anualmente assola – com maior ou menor intensidade – o Pantanal, devastando parte substancial do patrimônio natural de um dos mais ricos e delicados biomas da Terra, a informação de que em apenas 36 anos nosso estado teve reduzida em 57% a superfície antes permanente coberta por água é assustadora.
Principalmente porque, de acordo com o Mapbiomas, desenvolvido pelo Laboratório do Clima, a redução mais drástica da água de superfície foi registrada no Pantanal e em toda a bacia do rio Paraguai. Isso significa que, além de submetido ao drama cíclico das queimadas – não raro devastadoras, como a de 2020 – o Pantanal tem sido severamente afetado pelas consequências diretas da crise climática que atinge o planeta como um todo.
Se para qualquer região do mundo a redução das chamadas ‘superfícies líquidas’ representa gravíssima perda para o patrimônio natural, para o frágil equilíbrio da planície pantaneira esse declínio acentuado sinaliza para os riscos reais de um desastre ambiental irreversível no horizonte de algumas décadas.
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Para uma dimensão da tragédia anunciada, os estudos que colocam Mato Grosso do Sul como o estado que mais perdeu água de superfície em 36 anos – de 1,3 milhão de hectares para 580 mil – não levam em conta a sazonalidade estabelecida pelos ciclos de cheias e vazantes do Pantanal. Ou seja, as áreas daquele ecossistema consideradas perdidas eram até há pouco permanentemente cobertas por água.
Ainda que as causas dessa dramática redução de superfícies cobertas por água estejam nas mudanças climáticas, de natureza e dimensões globais, os seus reflexos no Pantanal são desastrosos. E dizem respeito a todos nós.
Para Cássio Bernardo, da WWF-Brasil, uma área úmida sem água perde o seu principal atributo ecológico. “O Pantanal está morrendo”, sentencia.
A sentença pode soar dramática. Mas é fundamental que a tomemos como um grito de alerta, como uma advertência contundente diante das graves vicissitudes climáticas e ambientais que assolam o Pantanal. E, como estamos vendo agora, todo o Mato Grosso do Sul.
*Iran Coelho das Neves
Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul.
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