Em julho próximo, ocorrerá a 70ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Maceió, Alagoas. No dia 26/07, quinta-feira, das 15h30 às 18h, participo na Mesa-Redonda “Mulheres na Ciência”. Sendo o único palestrante do sexo masculino, escolhi, naturalmente, homenagear uma mulher cientista. Deparei-me com textos impressionantes descrevendo uma pensadora singular, precursora em vários aspectos e por certo uma pioneira na ciência. Portanto, este Tributo a Hildegard von Bingen, considerada a monja beneditina que no século XII uniu o céu e a terra, é uma modesta forma de homenagear a todas as cientistas que romperam barreiras e preconceitos ao longo de todos os tempos.
Hildegard, nascida em 1098 na Alemanha, viveu até os 81 anos de idade. Em 1584, foi canonizada pelo papa Gregório XIII, em ato administrativo e sem processo formal, tendo o papa Bento XVI, em 2012, reafirmado oficialmente sua santidade, ao mesmo tempo em que a proclamou Doutora da Igreja.
Ela provinha de família nobre da região de Alzey, no sul da Alemanha. Desde criança a futura abadessa demonstrava habilidades visionárias. Seus pais a entregaram aos oito anos a um mosteiro de monges de Disivodemberg, o qual mantinha uma ala para mulheres dirigida por Jutta von Spannheim, que se tornaria sua segunda mãe e instrutora. Embora tenha começado a ter visões aos três, somente aos quarenta ela convenceu o papa a lhe permitir escrevê-las. Foi assim que começou a registrar tanto as visões, como livros de medicina, remédios naturais, cosmogonia e teologia.
Hildegard von Bingen escreveu e foi ativa em muitas áreas e, em especial, suas considerações sobre o orgasmo feminino foram absolutamente peculiares e inéditas. Ela tratava do tema sexo sem receio, tendo sido pioneira na descrição do orgasmo do ponto de vista de uma mulher, descrevendo que o prazer era experimentado a dois e que a mulher também o sentia. Considerando tratar-se de uma monja no século XII, há que se considerar o impressionante nível de atrevimento para a época. O ato sexual, para ela, era visto como algo inocente, sublime e ardente. Quanto ao pecado original de Eva, o único culpado era Satanás, invejoso da capacidade da mulher de gerar vida.
Em particular sobre ciência, Hildberg, entre os anos de 1151-1158, escreveu uma grande obra de medicina, Liber subtilitatum diversarum naturarum creaturarum, um livro das sutilezas das várias naturezas da criação. Após sua morte, esta obra foi dividida em duas partes: I. Physica ou Liber simplicis medicanae, um tratado de medicina naturalista, em nove capítulos, e II. Causae et curae ou Liber compositae medicanae, acerca da medicina composta. Nos textos as causas das enfermidades, seus remédios e o funcionamento interno do corpo humano e sua relação com o cosmos são abordados dentro de uma visão terapêutica de totalidade holística entre os quatro elementos formadores do universo: terra, água, ar e fogo.
Hildegard foi sempre fiel à sua visão integrada e holística dos fenômenos, na qual o natural e o sobrenatural, bem como o corpo e a alma, refletiam relações harmônicas entre o homem e a natureza. Ela conseguia conjugar esses elementos com a concepção de que boa parte das doenças seria consequência do pecado original, da separação entre o criador e a criatura. Neste sentido, a doença deixa de ser um assunto exclusivamente de ordem física, abrangendo também o espiritual, conectando os males que atingiam a alma e aqueles que afligem o corpo humano.
Em suma, nada mais atual, interessante e ilustrativo do que os pensamentos de Hildegard von Bingen. Por ocasião do evento na SBPC, tratarei de outros temas complementares associados a esta precursora da ciência moderna, em especial de sua incrível produção enquanto compositora, cujas contribuições à música são igualmente surpreendentes.
*Ronaldo Mota
Chanceler da Estácio
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