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ENTREVISTA Domingo, 07 de Agosto de 2011, 06:45 - A | A

Domingo, 07 de Agosto de 2011, 06h:45 - A | A

Excesso de velocidade mostra Campo Grande como palco de violência no trânsito

Valquíria Oriqui - Capital News (www.capitalnews.com.br)

O trânsito de Campo Grande é apontado como um dos que registra o maior índice de acidentes no Brasil. Com o objetivo de reduzir o número de óbitos e de acidentados, a Capital Morena vem realizando projetos junto à sociedade para conscientizar a população da necessidade de se mudar este perfil.

A reportagem do Capital News entrevistou a chefe de Divisão de Educação da Agetran, Ivanise Rotta, para saber um pouco mais sobre o comportamento dos motoristas que teimam em desrespeitar regras e  contribuir para um trânsito violento.

Segundo ela, um conjunto de fatores de risco (velocidade, infra-estrutura, motociclista, jovem condutor e álcool ) contribuem para que Campo Grande se destaque como uma Capital com alto número de mortes no trânsito.

Capital News - Como você analisa o trânsito de Campo Grande?

Ivanise Rotta - Posso afirmar que o trânsito de Campo Grande tem como seu principal fator de risco a velocidade. O cidadão campo-grandense não anda na velocidade permitida na via, que são 60 quilômetros por hora ou menos, na cidade, que é uma velocidade de segurança, quando o seu tempo de reação, de frenagem, lhe permite sair de situações do quase acidente. Se você tiver uma velocidade excessiva este acidente se torna fatal ou grave. O álcool é outro fator de risco determinante. Não existe nenhuma via rápida na cidade, todas são 60 quilômetros. O motorista não respeita essa velocidade por questão cultural e de infra-estrutura. A questão cultural antecede o momento que nós estamos vivendo agora. Toda uma vivência de um trânsito livre, pacato, de você chegar a fazer um trajeto em 10 minutos, que é o que as pessoas fazem hoje rapidamente. Modificou-se o quadro da nossa cidade. Hoje o trajeto simplesmente dobrou, ainda continua rápido. A velocidade e o álcool fazem com que a pessoa crie mais coragem e saia “atropelando”. A pessoa que passa sempre no mesmo lugar que tem lombada, acha que tem muita, mas se você anda Campo Grande inteira você acha que tem pouca. Só que a implantação de lombadas e radares e traffic calming estão nos planos da cidade.

Capital News – Como é calculado o índice de acidentes e óbitos em Campo Grande?

Ivanise Rotta - A minha análise é baseada nas pesquisas que nós estamos analisando desde 2010, então a partir do momento que você começa a fazer o retrato de Campo Grande dentro de dados confiáveis, que são os cruzamentos da Ciptran com a Santa Casa, que vão para o Ministério da Saúde cruzar com a AIH (Autorização de Internação Hospitalar), que são todos os óbitos e hospitalizados. Por meio deste cruzamento retorna pra gente. Quem realmente morreu em acidente de trânsito em Campo Grande, pois nós delimitamos. Esta morte pode ter ocorrido no local ou dentro de 30 dias.

Capital News - Porque o motociclista representa grande parte de óbitos ou acidentados?

Ivanise Rotta - Temos acompanhado um grupo de vítima que são os motociclistas. Não é porque ele é um doido ou pelo comportamento, pois até para quem está certo ele é um grupo de vítima. O motociclista é chamado de pedestres voadores, ele é tão vulnerável quanto um pedestre, só que tem o fator determinante velocidade. Estamos tratando ele de maneira especial. Estamos indo em grandes empresas e realizando um trabalho, não de falar o que é certo ou errado, pois ele tem plena consciência da viseira abaixada, da jugular presa, da velocidade de segurança, da não ultrapassagem pelo lado direito, das roupas claras, dos sapatos adequados. Não estamos indo para falar isso para eles pois eles têm obrigação de saber da legislação. Estamos mostrando porque ele é tão frágil e que se ele não conseguir cumprir as regras e agir de forma defensiva e abrir mão do seu direito, isso vai fazer com que ele se acidente. Um fator a ser observado é em relação ao clima. É um fenômeno comprovado, quanto mais frio, menos acidentes. O motociclista corre menos por causa do frio, as pessoas saem menos de casa, ingerem menos cerveja, o que reduz o número de acidente.

Capital News - O que está sendo feito nas vias para reduzir o número de acidentes?

Ivanise Rotta - Temos o mapeamento dos acidentes graves e fatais dentro de Campo Grande. Dentro deste mapeamento é feito as ações de fiscalização, intervenção da sinalização e intervenção de educação. Como é uma situação urgente nós estamos nestas regiões que estão espalhadas por toda Campo Grande, mas em locais específicos, que são chamados de locais críticos. Neste local é feito um estudo para ver o que é necessário: se um traffic calming, radar, lombada e assim vai se construindo uma cidade aonde os pontos críticos vão sendo tratados. Mas o trânsito é dinâmico orgânico: você trata aqui, surge um problema alí. Antes nossos acidentes eram centrais, hoje eles estão concentrados na periferia, pois nós, como cidadãos relaxamos mais na segurança, do tipo: não usar capacete, transportar um monte de criança em cima da motocicleta, não usar o cinto de segurança, abusar da velocidade ou estacionar em local inadequado. Quando o motorista estaciona na calçada para proteger o carro dele, ele não vê que está tirando o lugar do pedestre, que vai ter que passar pela rua. Ele não sabe se naquele lugar vai passar um carrinho de bebê. O individual continua prevalecendo sobre o coletivo. O trânsito é coletivo, sou eu e você, somos todos nós.

Capital News - Como o jovem condutor é analisado no trânsito?

Ivanise Rotta - Estamos num trânsito vietnamizado que sãos os jovens que vão para a guerra e os que estão morrendo no trânsito. De 18 a 35 anos, de acordo com nossas pesquisas eles são responsáveis por 57 % das mortes. De 18 a 25 são 27%. É o tipo de comportamento de inexperiência de vida e de trânsito. Quanto mais você tem a perder mais você cuida da sua própria vida. De 18 a 25 anos há muitos desafios e ele tem a síndrome da imortalidade, não constituiu família, os seus sonhos de ter carro e casa própria ainda estão somente no campo dos sonhos e ele ainda não começou a pensar nisso, está cursando faculdade, ainda não tem uma profissão escolhida. Um conjunto de fatores faz com que ele se arrisque mais. A psicologia explica que cada pessoa tem dentro de si um limite de riscos que ele acha que pode assumir que é nato do ser humano e mais ainda do jovem que precisa disso para se auto-afirmar e conforme vai chegando a idade ele vai ficando mais experiente e mais sábio e vai percebendo o que ele tem a ganhar e a perder.

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Excesso de velocidade é um dos principais causadores de acidentes no trânsito de Campo Grande
Fotos: Valquíria Oriqui/Capital News

Capital News - Qual projeto realizado por Campo Grande ?

Ivanise Rotta - Nós temos traçado dentro de 2011 até 2020 um caminho de mudança cultural. Trabalhar em micro-região e macro-região. Estamos na década da segurança viária, isso no mundo inteiro. Dentro disso temos o projeto nacional “Vida no Trânsito” que Campo Grande faz parte junto com Belo Horizonte, Curitiba, Palmas e Terezina. Temos até 2015 este monitoramente. Dentro dos fatores de risco e grupo de vitimas que são velocidade, infra-estrutura, motociclista, jovem condutor e álcool, nós criamos esses cinco programas, dentro de cada um existem os projetos. Na questão velocidade, por exemplo, temos projetos com grandes empresas e trabalhamos com essas pessoas enquanto motociclistas. Os acidentes acontecem no trajeto casa- trabalho, trabalho-casa, casa-laser, laser-casa. Oficinas de sensibilização, meia hora ou uma hora de conversa não muda comportamento mas leva à reflexão, então, se a pessoa não pensar todos os dias no seu trajeto, no que ela tem que fazer, neste comprometimento com o poder público, ela realmente não vai modificar. Precisamos do apoio da sociedade.

Capital News - Como a população vê o “Placar da Vida”?

Ivanise Rotta - A sociedade se incomodou com o Placar da Vida, antes se dava uma notícia assim: Em 2010 morreram no local 56 pessoas. Agora nós temos: morreram na Santa Casa, estão lesionados, sequelados, internados. Então essa notícia incomoda, e você só modifica a partir de algo que te incomoda. E você não está sozinho no trânsito. “Ah, se eu morrer o problema é meu!” Não, o problema não é seu, é da sociedade, você pode matar um adolescente. E você, mudando sua conduta vai trazer outras pessoas para copiar o que você está fazendo. Se você para numa faixa de pedestre por exemplo.

Capital News - A culpa deste cenário é somente do cidadão?

Ivanise Rotta - Toda culpa não é do cidadão, do poder público nem da polícia, é uma culpa compartilhada. Cada um tem que fazer sua parte e cobrar do outro. Há sim muita gente correta em Campo Grande. Mas os poucos estão morrendo. É inadmissível que se perca vida no trânsito. Nós já temos muitos outros problemas de epidemias e doenças que não têm controle, que a classe médica e os grandes cientistas não conseguiram achar a cura. O trânsito tem cura, que é a questão da prudência e do evitar. O Clube do Setinha trabalha com crianças de 4 a 12 anos. Por meio do site eles jogam, brincam e participam de uma oficina lúdica e recebem boné e camiseta. Como eu já disse o comportamento não muda da noite para o dia e nem em uma conversa de 40 minutos.

Capital News - Como impor ao condutor que as leis devem ser seguidas?

Ivanise Rotta - Você não tem o poder sobre o outro. A influência que sua mãe tem hoje sobre você é o que ela te ensinou. Você escolhe fazer ou não. Não temos poder sobre o outro, nós passamos a informação e de acordo com sua formação ética, moral e com seus valores você vai fazer a sua escolha de correr ou não, usar o celular ou não, estacionar em vaga de idoso ou não. Tem gente que liga o pisca alerta e para em pista dupla e fala que é rapidinho. Só que se uma pessoa estiver tendo um infarto atrás de você, ela vai morrer por causa desse minutinho. Então é pensar no outro, nas consequências. A partir do momento que eu consigo abrir mão desse individualismo eu consigo viver de forma mais harmoniosa no trânsito. Mas sem fiscalização e punição isso se torna muito difícil. Pois se eu começo a ver que é fácil burlar a lei para eu me satisfazer individualmente eu vou fazer. Tem que ter junto com a educação, um trabalho de punição, se você considerar que o motorista assume riscos e é um infrator por natureza.

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Placar da Vida registra o número de vidas preservadas no trânsito de Campo Grande
Fotos: Valquíria Oriqui/Capital News

 


Por Valquíria Oriqui - Capital News (www.capitalnews.com.br)

 

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