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Burnout: a epidemia silenciosa que a legislação brasileira ainda ignora

Por André Theodoro*

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O burnout, ou síndrome do esgotamento profissional, foi recentemente reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma doença ocupacional. Esse reconhecimento é um marco importante, pois reflete a gravidade de um problema que afeta milhões de trabalhadores em todo o mundo. No Brasil, onde a cultura do trabalho excessivo e a pressão por produtividade são frequentemente glorificadas, o burnout se tornou uma realidade alarmante. No entanto, a legislação brasileira ainda está aquém de oferecer uma resposta adequada a esse fenômeno, que exige uma abordagem multifacetada e sensível.

O que é o Burnout e por que ele importa?

O burnout é caracterizado por três dimensões principais: exaustão emocional, despersonalização (distanciamento emocional do trabalho) e redução da realização profissional. Ele não surge do dia para a noite, mas é resultado de um processo crônico de estresse no ambiente de trabalho, muitas vezes associado a longas jornadas, falta de autonomia, cobranças excessivas e ambientes tóxicos. Diferentemente de um simples cansaço, o burnout tem consequências profundas para a saúde física e mental do trabalhador, podendo levar a depressão, ansiedade, doenças cardiovasculares e até ao afastamento permanente do trabalho.

No Brasil, onde a carga horária de trabalho já é uma das mais altas do mundo e a informalidade atinge milhões de pessoas, o burnout se tornou uma epidemia silenciosa. Profissionais de diversas áreas, especialmente aqueles em setores de alta pressão como saúde, educação e tecnologia, estão cada vez mais vulneráveis. No entanto, apesar de sua gravidade, o burnout ainda é subdiagnosticado e subtratado, muitas vezes confundido com outras condições ou ignorado por empregadores e até pelos próprios trabalhadores.

A legislação brasileira e o Burnout

A legislação brasileira, por meio da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e da Constituição Federal, estabelece uma série de direitos e garantias para os trabalhadores, incluindo limites à jornada de trabalho, intervalos obrigatórios e o direito a um ambiente de trabalho seguro e saudável. No entanto, quando se trata de questões relacionadas à saúde mental, como o burnout, a legislação ainda é insuficiente.

Atualmente, o burnout pode ser enquadrado como uma doença ocupacional, o que significa que, em tese, o trabalhador diagnosticado com a síndrome tem direito a benefícios como auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e estabilidade provisória após o afastamento. No entanto, na prática, a comprovação do nexo causal entre o trabalho e o burnout é um desafio enorme. Muitas vezes, os peritos do INSS não reconhecem a relação entre a doença e as condições de trabalho, deixando os trabalhadores desamparados.

Além disso, a CLT não prevê mecanismos específicos para prevenir o burnout. Embora a Norma Regulamentadora nº 7 (NR-7) estabeleça a obrigatoriedade do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), que inclui a avaliação de riscos psicossociais, a implementação dessas medidas ainda é incipiente na maioria das empresas. A falta de fiscalização e a cultura organizacional que prioriza resultados em detrimento do bem-estar dos colaboradores contribuem para a perpetuação do problema.

Uma visão diferente: responsabilidade compartilhada

Enquanto muitos apontam o dedo exclusivamente para as empresas como responsáveis pelo burnout, é preciso adotar uma visão mais ampla e sensata. A responsabilidade é, na verdade, compartilhada entre empregadores, trabalhadores e o Estado. As empresas têm o dever de criar ambientes de trabalho saudáveis, com jornadas justas, políticas de gestão humanizadas e programas de apoio à saúde mental. No entanto, os trabalhadores também precisam assumir parte dessa responsabilidade, reconhecendo seus limites e buscando ajuda quando necessário.

O Estado, por sua vez, tem um papel crucial na criação de políticas públicas que promovam a saúde mental no trabalho. Isso inclui a atualização da legislação trabalhista para incluir medidas específicas de prevenção ao burnout e a ampliação do acesso a serviços de saúde mental, tanto no sistema público quanto no privado. Além disso, é fundamental investir em campanhas de conscientização para desmistificar o burnout e incentivar a busca por tratamento.

O burnout é um problema complexo que exige uma resposta igualmente complexa. O reconhecimento da OMS foi um passo importante, mas ainda há muito a ser feito, especialmente no Brasil, onde a legislação e a cultura organizacional ainda estão defasadas em relação às necessidades dos trabalhadores. É urgente que empregadores, trabalhadores e o Estado trabalhem juntos para enfrentar esse desafio.

As empresas precisam adotar práticas mais humanizadas e investir na saúde mental de seus colaboradores. Os trabalhadores devem estar atentos aos sinais de esgotamento e buscar ajuda sem medo de estigma. E o Estado precisa modernizar a legislação trabalhista, garantir a fiscalização das normas existentes e ampliar o acesso a tratamentos de saúde mental.

O burnout não é apenas uma questão individual; é um problema social que reflete as falhas de um sistema que prioriza a produtividade em detrimento do bem-estar. Enfrentá-lo exige coragem, empatia e uma mudança de paradigma. Afinal, um trabalhador saudável é um investimento no futuro do país.

 

*André Theodoro Queiroz Souza
OAB MS 17017. Formado em direito pela UCDB e traz sua expertise como especialista em direito do trabalho e processos do trabalho. Ele também possui uma pós-graduação pela faculdade Damásio de Jesus e pelo Insted/Ematra, o que o torna um advogado excepcionalmente bem preparado para lidar com disputas trabalhistas complexas.

 

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