A crise internacional atinge o setor sucroalcooleiro, especialmente a produção de etanol, uma das principais apostas do governo para incluir o Brasil entre as potências econômicas mundiais. Influenciada pela queda do preço do petróleo no mercado internacional, a cotação do álcool despencou e a margem de ganho desapareceu. A crise interrompeu o financiamento da produção e as usinas estão sem recursos para preparar a moagem da próxima safra. Algumas não conseguiram pagar fornecedores e estão com dificuldade em rescindir contratos com a mão-de-obra usada na safra.
Pelo menos três grupos tradicionais - Companhia Albertina, João Lyra e Naoum - entraram com pedidos de recuperação judicial. “As empresas já estavam em situação difícil e a crise acelerou o processo”, diz o diretor-técnico da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica), Antonio de Pádua Rodrigues. Segundo ele, a fuga do capital que financiava atividades sucroalcooleiras põe em risco a safra de 2009. “O desmonte de toda a usina para a revisão anual e a reforma de 15% a 20% dos canaviais exigem soma considerável de recursos, hoje não disponíveis.”
As empresas que dispunham de capital de giro, obtido com as boas safras de 2006 e 2007, investiram na expansão da atividade produtiva e na agregação de novos negócios, como a co-geração de energia. “Os preços dos últimos anos não foram suficientes para repor todo o dinheiro que saiu”, diz Rodrigues. Também não saíram os financiamentos de longo prazo e a demanda internacional não cresceu como se previa. Este ano, o volume de cana que ficará nos canaviais para ser colhido na próxima safra (40 milhões de toneladas) é o maior dos últimos anos. A Destilaria Londra, de Itaí, no sudoeste paulista, exportou menos álcool do que esperava, segundo o diretor Paulo André Macedo. “Havia expectativa que não foi atendida, mas esperamos que as vendas externas melhorem.” De acordo com ele, o preço baixo do álcool prejudicou o plano da empresa de moer 1,25 milhão de toneladas este ano. Cerca de 250 mil toneladas ainda estão no campo à espera da colheita. “Íamos encerrar a moagem no dia 20, mas devemos estender até 10 de janeiro.”
Com cana sobrando, a usina deixou de comprar dos produtores da região que investiram por conta própria na lavoura. “Estamos pegando dos que têm contrato de arrendamento com a empresa.”
O agricultor Lourenço Sperandio, de Taquarituba, plantou 120 hectares de cana e não tem para quem vender. O atraso na colheita já deu prejuízo de pelo menos R$ 30 mil. Ele esperava fornecer para a usina que o Grupo Farias iria instalar no município. O projeto foi adiado e a empresa demitiu 70 dos 92 funcionários.
“Muitos produtores plantaram pensando que seria bom negócio, agora não sabem o que fazer com a cana”, diz o presidente do Sindicato Rural, Isaac Leite. A segunda unidade da Usina Iracema, que deveria estar moendo a segunda safra em Riversul, também adiou a operação. A cana é absorvida parcialmente pela destilaria do mesmo grupo em Itaí. Na região de Ourinhos, cortadores de cana que trabalharam na safra não receberam as rescisões e estão sem dinheiro para voltar para casa. Eles pediram a intervenção do Ministério Público do Trabalho.
O diretor da Unica teme que os reflexos da crise se estendam às safras de 2009 e 2010. “O dinheiro desapareceu e o custo aumentou significativamente. Quantos vão ter condições de preparar as usinas e as lavouras para mais um ano de incertezas?” Ele ressalva que alguns grupos empresariais que entraram no setor devem manter seus investimentos, pois não dependem só do açúcar e do álcool.
É o caso da ETH Bioenergia, controlada pela Odebrecht. A empresa anunciou aprovação de linha de crédito de longo prazo de R$ 1,15 bilhão do BNDES para instalar três unidades - Santa Luzia I (MS), Conquista do Pontal (SP) e Rio Claro (GO) - que iniciam produção em meados de 2009. (Estadão)