O colunista do Estadão, José de Souza Martins, conta que tomou um táxi para ir a uma conferência sobre o caos urbano. Perdeu uma hora e meia e gastou 50 reais. Das janelas do auditório, via as pessoas a embarcar no trem metropolitano, a cada 20 minutos. Quando saiu, resolveu voltar para casa de trem. No guichê, informaram que ele não pagaria por ter mais de 60 anos. A viagem foi de graça e demorou 20 minutos, que ele usou para se deliciar com o livro que levava. Ao desembarcar na estação, ainda teve que tomar um táxi para chegar a casa, e pagou 10 reais.
Lembro-me de ter passado minha juventude andando de bonde, como todo mundo. No bonde misturavam ternos e gravatas com roupas informais. Com o advento da indústria automobilística nacional, criou-se o preconceito contra o transporte coletivo. O carro – novo, mas antiquado – virou símbolo de status e quem queria mostrar poder aquisitivo passou a não usar transporte coletivo. José de Souza Martins lembra ter visto, a desembarcar para a ópera no La Scala, de Milão, do metrô, dos ônibus ou dos bondes, senhoras de casacos de pele caríssimos e senhores com ternos de marca, saídos da elegante Via Montepulciano.
Parece-me que o estímulo à indústria do automóvel desestimulou o transporte coletivo. E o resultado aí está: nossas cidades já não têm lugar para estacionar e nossas ruas e avenidas já não suportam tanto tráfego. A crise que pegou as vendas de carro traz a bênção de permitir uma parada para pensar o que queremos do futuro de nossas cidades. Se entupidas de carros inúteis – que não têm onde estacionar nem como circular -, geradores de impaciência e de esgotamento nervoso, ou organizadas e civilizadas, com eficientes meios de transporte coletivo.
Um carro é o meio mais caro de transporte. Aplica-se nele 20 mil, 50 mil, ou 300 mil, e ele fica parado a maior parte do tempo. Quem usa muito o carro, não fica nele 3 horas por dia. Das 24 horas por dia, uso meu carro, na melhor hipótese, uma hora. Quer pior aplicação de dinheiro do que essa? E se for usado só para transportar o motorista, imagine o custo do combustível e de desgaste do veículo, mas os riscos, o estacionamento, a poluição da atmosfera... É muito desperdício.
Paris está dando um exemplo. Desde junho do ano passado, começou um sistema de bicicletas públicas. No início, eram 10 mil à disposição da população. O uso por meia hora é gratuito. Deu certo e estão pondo mais bicicletas. 10 mil bicicletas estavam transportando 150 mil parisienses por dia, já que cada uma era usada por uma média de 15 pessoas. Só os taxistas não gostaram. Pois agora Paris vai fazer o mesmo com carros, que ficarão à disposição em vários pontos da cidade. Aluguel equivalente a 10 reais por meia hora. Ou assinatura mensal de 50 reais. Sem precisar comprar o carro nem o combustível, todos terão carro. Como o transporte individual, que veio para dar qualidade de vida, está deteriorando a qualidade de vida, a sensatez está reagindo.