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ENTREVISTA Sábado, 23 de Setembro de 2023, 08:32 - A | A

Sábado, 23 de Setembro de 2023, 08h:32 - A | A

Entrevista

Setembro Amarelo: quem fala sobre tirar a vida deve ser levado a sério

Falar sobre o tema é essencial, mesmo que seja um assunto delicado, diz especialista

Renata Silva
Especial para o Capital News

Divulgação

Setembro Amarelo: quem fala sobre tirar a vida deve ser levado a sério

Ajudar alguém que está passando por pensamentos suicidas é crucial e pode fazer uma grande diferença, enfatiza psicólogo Thiago Ayala

Como prevenir o suicídio? O tema ainda é um tabu na sociedade e falar sobre ele ainda é um desafio. No entanto, com dados cada vez mais alarmantes e para uma prevenção efetiva, discutir o assunto não é só uma necessidade, é uma urgência.

Há nove anos, o mês de setembro existe com o objetivo de debater o tema através da campanha “setembro amarelo”. É o mês onde organizações debatem o suicídio através de campanhas e ações que visam conscientizar as pessoas bem como evitar o seu acontecimento.

De acordo com dados da Secretaria de Saúde do município, em Campo Grande, os casos de suicídio cresceram. Para se ter uma ideia, a alta passa de 170% comparando o ano de 2010 com ano passado. A Sesau começou a registrar a série histórica de suicídios na cidade há 13 anos, de lá pra cá, o ato fez 832 vítimas.

Em 2021, 85 pessoas tiraram a própria vida na Capital, no ano passado, esse número saltou para 115, aumento de 35%. Quando falamos de suicídio entre os jovens, os dados também mostram aumento, 25 jovens entre 15 e 24 anos se mataram em 2021, ano passado foram 7 a mais que 2021.

Para esclarecer um pouco mais sobre o assunto o Capital News bateu um papo com o psicólogo especialista em Psicologia da Saúde e Terapia Cognitivo Comportamental Thiago Ayala.

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Falar sobre o suicídio é essencial, mesmo que seja um assunto delicado

1- Capital News: Falar sobre o suicídio é um tema delicado para muita gente, mas precisa ser falado, certo? Como abordá-lo?
Thiago Ayala: Falar sobre o suicídio é essencial, mesmo que seja um assunto delicado. Precisamos abordá-lo com empatia e compreensão, oferecendo um espaço seguro para conversar sobre emoções e pensamentos. Afinal, é a primeira etapa para a prevenção, e todos precisam saber que há ajuda disponível. A conscientização é fundamental, e todos podemos contribuir. Quando compartilhamos informações responsáveis sobre prevenção ao suicídio, estamos dando um passo importante para ajudar aqueles que podem estar lutando silenciosamente.

2- Capital News: Que sinais uma pessoa com ideias suicidas emite? As pessoas que falam em suicídio só o fazem para chamar a atenção e não pretendem, de fato, terminar com suas vidas?
Thiago Ayala: É vital entender que as pessoas que estão lidando com pensamentos suicidas podem emitir diferentes sinais, e não falam sobre isso para chamar a atenção. É crucial levar todos os sinais a sério, pois a maioria das pessoas que falam sobre suicídio estão enfrentando um sofrimento emocional real. Alguns sinais comuns incluem mudanças drásticas de comportamento, como isolamento social, expressão de sentimentos de desesperança, desinteresse em atividades que antes eram apreciadas, aumento do consumo de álcool ou drogas, e até mesmo fazer planos concretos para o suicídio. Oferecer apoio, ouvir sem julgamentos e encorajar a busca por ajuda profissional, como a terapia, pode ser a diferença entre salvar uma vida e não fazer nada. A terapia pode ser um espaço seguro para explorar esses sentimentos e desenvolver estratégias para lidar com eles de maneira saudável, sendo uma oportunidade valiosa para se fortalecer emocionalmente e criar resiliência.

3- Capital News: Quais são os fatores de risco que podem levar uma pessoa ao suicídio?
Thiago Ayala: Existem vários fatores de risco que podem contribuir para que alguém tenha pensamentos suicidas. É importante estar ciente deles para poder identificar e ajudar as pessoas em risco. Alguns dos fatores de risco incluem problemas de saúde mental como depressão, transtorno bipolar, ansiedade, esquizofrenia e outros distúrbios psicológicos que podem aumentar o risco. O histórico familiar também exerce influencia principalmente quando um membro da família já cometeu suicídio, isso pode aumentar a vulnerabilidade. Tentativas anteriores também aumentam o risco. Normalmente pensamos que por a tentativa ter falhado a pessoa não vai levar para frente essa ideia, mas a estatística mostro o contrário, pessoas que já planejaram o suicídio tem um risco maior de concretizar essa ideia. Abuso de substâncias como álcool e droga influenciam e o perdas significativas como um ente querido, emprego ou relacionamento podem ser um gatilho. É importante estar ciente desses fatores, não apenas para identificar quando alguém está em risco, mas também para promover um ambiente de apoio. Você pode ajudar simplesmente estando presente, ouvindo atentamente e oferecendo apoio emocional quando necessário.

Ajudar alguém que está passando por pensamentos suicidas é crucial e pode fazer uma grande diferença

4- Capital News: Como ajudar?
Thiago Ayala: Ajudar alguém que está passando por pensamentos suicidas é crucial e pode fazer uma grande diferença. Existem algumas maneiras de oferecer apoio de forma mais assertiva. Escute com empatia estando presente e ouça a pessoa com atenção, sem julgamentos. Permita que ela se expresse e compartilhe seus sentimentos. Ofereça apoio emocional mostrando que você está preocupado e está disponível para ajudar. Dizer coisas como "Estou aqui para você" pode fazer toda a diferença. Pergunte diretamente se você suspeitar que alguém está em perigo iminente, não tenha medo de perguntar diretamente sobre seus pensamentos suicidas. Isso pode abrir uma porta para uma conversa franca. Evite minimizar ou julgar dizendo coisas como "Você não deveria se sentir assim”, “Isso é bobagem." ou “Sua vida é muito boa para de pensar nisso”. Em vez disso, valide os sentimentos da pessoa. Incentive à busca de ajuda profissional: sugerindo que uma pessoa fale com um profissional de saúde mental, como psicólogo, que possa oferecer orientação e tratamento adequado. Importante também manter contato regularmente com uma pessoa em risco para mostrar que ela é importante e você está disponível para ajudar.

5- Capital News: Pode-se obrigar uma pessoa a buscar tratamento? Como a família deve agir?
Thiago Ayala: Não é possível obrigar alguém a buscar tratamento psicológico ou psiquiátrico contra sua vontade, a menos que haja uma ameaça iminente à vida da pessoa. No entanto, a família e os amigos desempenham um papel crucial no processo de incentivo ao tratamento e apoiam uma pessoa em dificuldades. Comunique-se abertamente, mostre empatia e eduque-se sobre doenças mentais. Respeite os limites da pessoa, mas mantenha-se disponível. Você pode sugerir gentilmente a terapia como uma opção, mas lembre-se de que a decisão final deve ser dela. Sua compreensão e apoio podem ser um farol de esperança para quem está enfrentando desafios emocionais.

6- Capital News: Que atividades podem ajudar a afastar as ideias suicidas?
Thiago Ayala: Compreendo a importância de abordar essa questão de forma sensível. Quando se trata de afastar ideias suicidas, é fundamental lembrar que nenhuma atividade isolada garante eficácia total, mas algumas estratégias podem ajudar. Praticar técnicas de relaxamento, como a respiração profunda, pode ajudar a aliviar a tensão emocional. A Terapia Cognitiva Comportamental (TCC) destaca a importância de identificar e desafiar pensamentos negativos. Manter um diário de pensamentos pode auxiliar na identificação de padrões de pensamento negativos, permitindo que uma pessoa trabalhe neles. Além disso, estabelecer metas realistas e alcançáveis pode fornecer um senso de realização e propósito. A conexão social também desempenha um papel vital, pois manter contato com amigos e familiares pode aliviar a sensação de isolamento. Lembrando que a combinação dessas estratégias pode variar de pessoa para pessoa. É importante que uma pessoa em dificuldades encontre ou funcione melhor para ela. No entanto, é importante ressaltar que procurar ajuda profissional é fundamental. Busque por um psicólogo que possa oferecer apoio especializado para desenvolver estratégias personalizadas de enfrentamento. A terapia é uma ferramenta poderosa para entender e lidar com pensamentos suicidas de maneira eficaz. Se conhecer alguém que esteja passando por esse momento incentive a buscar ajuda de um profissional de saúde mental para orientação específica e apoio durante esse processo.

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Setembro Amarelo: quem fala sobre tirar a vida deve ser levado a sério

Falar sobre o suicídio é essencial, mesmo que seja um assunto delicado, afirma especialista

7- Capital News: As taxas de suicídios aumentaram 30% nos últimos 10 anos entre adolescentes. Há alguma explicação para isso?
Thiago Ayala: O aumento nas taxas de suicídio entre adolescentes é alarmante e complexo, com vários fatores contribuintes. Pressões sociais, isolamento digital, acesso a informações sobre métodos suicidas na internet e problemas de saúde mental são algumas das causas possíveis. Para reverter essa tendência, é crucial promover a conscientização sobre saúde mental e criar ambientes de apoio nas escolas e comunidades. Educar os jovens sobre a importância de cuidar da saúde mental desde cedo e incentivar o diálogo aberto pode ajudar a prevenir o suicídio.

8- Capital News: Uma mudança brusca e negativa, ou mesmo uma depressão, pode provocar uma atitude suicida?
Thiago Ayala: Sim, uma mudança brusca e negativa na vida de alguém, como uma tragédia pessoal, uma perda significativa, um trauma, ou uma depressão grave, pode aumentar o risco de atitudes suicidas. Esses eventos podem sobrecarregar emocionalmente uma pessoa, levando-a a sentir-se desesperada e sem esperança. Sentimentos de desesperança e isolamento podem surgir. É fundamental considerar os sinais de alerta e oferecer apoio emocional. Muitas vezes, um ouvido atento e solidário pode ser o primeiro passo para alguém encontrar esperança novamente.

9- Capital News: Os casos de reincidência são comuns nas tentativas de suicídio?
Thiago Ayala: A reincidência em casos de tentativa de suicídio é uma situação delicada e multifacetada. Entender as possíveis causas e o que pode ser feito para prevenir recaídas é fundamental, tanto para uma pessoa que está passando por isso quanto para seus familiares e entes queridos. As causas de reincidência podem variar, mas algumas situações comuns incluem tratamento incompleto ou inadequado, fatores de risco não gerenciados e isolamento social. Muitas vezes, a falta de continuidade no tratamento ou a não obtenção do apoio necessário para lidar com os problemas subjacentes podem contribuir para a reincidência. Para prevenir a reincidência, é crucial abordar essas causas de maneira eficaz: Tratamento Profissional: A busca por ajuda profissional é prioritária. A terapia, especialmente a Terapia Cognitiva Comportamental (TCC), pode fornecer ferramentas para entender e modificar padrões de pensamento negativo, bem como desenvolver habilidades de enfrentamento saudável. Incentive uma pessoa a continuar com o tratamento e a buscar ajuda especializada. Comunicação Empática: Família e amigos desempenham um papel fundamental. Mantenha uma comunicação aberta, empática e livre de julgamentos. Ouça atentamente o que a pessoa está passando, ofereça apoio emocional e fique presente. Rede de Apoio: Ajuda a pessoa a construir e fortalecer sua rede de apoio social. Conectar-se com amigos, familiares e grupos de apoio pode reduzir o isolamento e fornecer um sistema de suporte confiável. Educação sobre Saúde Mental: Tanto a pessoa que enfrenta pensamentos suicidas quanto seus familiares podem se beneficiar da educação sobre saúde mental. Compreender os desafios emocionais e os recursos disponíveis pode ser fortalecedor. Planos de Segurança: Trabalhar junto com um profissional de saúde mental na criação de um plano de segurança é essencial. Isso pode incluir estratégias específicas para lidar com crises e formas de acesso rápido à ajuda profissional. Monitoramento Contínuo: A prevenção da reincidência exige monitoramento constante. Fique atento aos sinais de alerta e não hesite em procurar ajuda profissional sempre que necessário. É importante lembrar de que a prevenção da reincidência é uma jornada contínua e desafiadora. A empatia, o apoio e a busca por ajuda profissional são elementos-chave para promover a recuperação emocional e o bem-estar a longo prazo.

10- Capital News: Por que o mês Setembro Amarelo, que debate o tema é importante?
Thiago Ayala: O mês de Setembro Amarelo, dedicado à conscientização sobre a prevenção do suicídio e à promoção da saúde mental, desempenha um papel crucial em nossa sociedade. É importante destacar que embora tenhamos um mês dedicado a essa causa, todos os dias são importantes para abordar essas questões com empatia e atenção. Este mês aumenta a conscientização sobre a importância da saúde mental em nossa vida cotidiana, lembrando-nos de que a saúde mental é tão crucial quanto a saúde física. Além disso, ele desempenha um papel fundamental na redução do estigma em torno das questões de saúde mental e do suicídio, encorajando conversas abertas e criando um ambiente onde as pessoas se sintam mais à vontade para buscar ajuda e compartilhar suas experiências. O Setembro Amarelo oferece recursos e informações essenciais sobre a prevenção do suicídio, incluindo a identificação de sinais de alerta, promoção de estratégias de enfrentamento saudável e incentivo à busca de ajuda profissional quando necessário. Embora seja um mês dedicado a essas questões, é importante lembrar que todos os dias são importantes para esse olhar. A saúde mental não deve ser negligenciada e merece nossa atenção contínua. Seja um ouvinte atento, esteja disposto a apoiar aqueles que precisam e promover a conscientização sobre a saúde mental em todas as épocas do ano. Juntos, podemos criar uma sociedade mais compassiva e solidária.

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