Em meio a uma enxurrada de cancelamentos unilaterais de contratos – por vezes no meio de um tratamento médico - e outras práticas consideradas abusivas por parte de muitas operadoras de planos de saúde, o anúncio de uma importante decisão divulgada pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), no último dia 10 de dezembro, finalmente pode servir como amparo para o lado mais frágil dessa que tem sido uma conturbada relação contratual: o beneficiário do plano, que muitas vezes se sente refém dele.
O órgão, vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, ouviu as queixas desses consumidores e notificou 14 empresas do setor, exigindo a correção de irregularidades contratuais por elas cometidas em até 60 dias. Essas irregularidades foram identificadas a partir de um detalhado estudo de monitoramento do mercado da Senacon. Após denúncias, essas empresas foram alvo de processos administrativos. Entre as acusadas, figuram nomes de peso como Amil, Bradesco Saúde, Hapvida NotreDame, Prevent Senior, Omint e Unimed Nacional.
As denúncias recorrentes que fomentaram a decisão da Senacon incluem não apenas o cancelamento unilateral de contratos, mesmo de beneficiários em tratamento médico, como também alterações na rede hospitalar sem que se respeitasse parâmetros legais, entre eles a distância mínima para atendimentos; a comunicação inadequada sobre procedimentos e prazos para cancelamento; a falta de clareza nas informações contidas em contratos; assim como a falta de transparência nas informações sobre portabilidade entre operadoras de planos de saúde.
A lista das empresas notificadas é composta pelas maiores operadoras em atividade no país, que atendem, ou deveriam atender milhares de brasileiros que pagam um valor cada vez mais elevado para ter garantido o suporte à saúde, o que não tem acontecido. Somente entre janeiro e outubro desse ano, de acordo com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), órgão que regula a atividade das operadoras no país, foram 13.339 queixas sobre cancelamentos unilaterais de planos de saúde, ou seja, mais de 1.300 reclamações por mês.
Para entender o tamanho do problema enfrentado por esses beneficiários, basta imaginar a situação: você está no meio de um tratamento crucial para sua saúde e, de repente, seu plano é cancelado sem aviso prévio. Ou então, a rede credenciada muda drasticamente, deixando você sem acesso aos médicos e hospitais que confia. Há casos diversos dessa interrupção, inclusive envolvendo pacientes com câncer em estágio avançado, provocando elevado risco de morte. Essas são apenas algumas das práticas abusivas que violam o Código de Defesa do Consumidor e que a Senacon busca combater com sua relevante decisão.
Além do prazo de 60 dias, a Senacon instituiu um grupo de trabalho com a participação das operadoras, para que apresentem, no mesmo período, soluções concretas para esses problemas relatados. Durante esses dois meses, os processos administrativos foram suspensos, mas podem ser retomados caso as irregularidades persistam.
Apesar de entidades representativas das operadoras de planos de saúde afirmarem que respeitam as normas da ANS e que não possuem em suas políticas o cancelamento unilateral, as denúncias formais levantadas pela Senacon demonstram que a realidade vivenciada por muitos consumidores é diferente.
Portanto, a notificação da Senacon pode ser considerada uma vitória para os consumidores de planos de saúde. É fundamental que os usuários conheçam seus direitos e que denunciem práticas consideradas abusivas. Seus direitos devem ser cumpridos contratualmente, via processos administrativos ou ainda se for necessário, por meio da via judicial, de modo que a garantia ao acesso à saúde, objetivo de quem contrata um plano, seja efetivamente preservada.
*Natália Soriani
Advogada especialista em Direito Médico e da Saúde e sócia do escritório Natália Soriani Advocacia
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