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Rural Sábado, 26 de Julho de 2008, 07:22 - A | A

Sábado, 26 de Julho de 2008, 07h:22 - A | A

Cana-de-açúcar segura o gado durante a seca

Redação Capital News (www.capitalnews.com.br)

Devido à estiagem característica do período de seca no Brasil Central, as pastagens ficam escassas, prejudicando a alimentação dos bovinos. Essa situação provoca a ocorrência do já famoso boi sanfona - que ganha peso ou aumenta de produção nas águas e os perde na seca. Para os pequenos pecuaristas, que trabalham com gado leiteiro e não possuem condições de formar silos de milho ou sorgo, uma das soluções mais utilizadas é complementar a alimentação dos bovinos com a cana-de-açúcar.

As vantagens de seu uso como volumoso, é que a cana-de-açúcar atinge sua maior concentração de energia durante o período de seca. Além disso, a planta produz a maior quantidade de massa seca por hectare de todas as forrageiras pesquisadas atualmente no Brasil.

Ciente dessas boas características da cana, o pecuarista Geraldo Maia, que é presidente da Associação dos Produtores de Leite do Distrito Federal e Entorno (Aproleite), tem plantado em sua propriedade, em Brazlândia, três hectares de cana-de-açúcar.

Diariamente, o rebanho de 30 matrizes de Maia produz cerca de 400 litros de leite por dia. Para alimentar essas matrizes no período de estiagem, diariamente o produtor fornece duas carroças cheias de cana triturada. Além da forrageira, ele complementa a alimentação do rebanho com uréia, amônia e ração balanceada.

Os bezerros e as vacas que não estão em lactação ficam soltos no pouco pasto verde que ainda resta na propriedade de 42 hectares. "Na época da seca, a única forma de segurar a produção de leite é com a cana", argumenta o pecuarista.

Silo em pé

Os pesquisadores do Centro de Transferência de Tecnologias de Raças Zebuínas com Aptidão Leiteira (CTZL) da Embrapa Cerrados, instalado na área rural do Gama, explicam que o tratamento do gado com a cana-de-açúcar, triturada além de eficaz, é mais simples que outras técnicas. "A grande vantagem do uso da cana-de-açúcar não é estocar em silo, e sim, estocar em pé", afirma o veterinário e pesquisador Moacir Saueressig, coordenador do CTZL.

Na propriedade do Geraldo Maia, apenas dois trabalhadores conseguem alimentar todo o gado com a cana. "Se eu fosse fazer um silo de milho teria de alugar um trator, plantar a lavoura, e depois, fazer a silagem. Tudo isso ficaria bem mais caro que usar a cana dessa forma", justifica Maia.

Apesar das vantagens da cana na hora de plantar e produzir a forragem, Moacir Saueressig alerta que quando o pecuarista precisa que o gado engorde durante a seca, a cana não é a melhor escolha.

"Em termos de ganho peso por nutriente ou pelo valor de reais gastos com o alimento, o milho é mais vantajoso", argumenta o coordenador do CTZL. Apesar de ser um alimento mais caro, o milho tem mais nutrientes que a cana, daí, a vantagem de sua utilização.

Com uso de cana-de-açúcar, o ganho de peso do gado caria entre 400 g a 700 g por dia. Usando milho, o ganho é de até 1.200 kg/dia e, com sorgo, chega a 1.175 kg/dia.

Cultivar bem adaptada

Outro fator importante para se ter um bom canavial é a escolha do tipo de planta que melhor se adapta ao solo da região. A maioria das canas desenvolvidas pelas pesquisas de melhoramento genético são destinadas à indústria do açúcar e do etanol. Por isso, os pesquisadores recomendam que o produtor não deve plantar apenas uma variedade pois, caso a planta não apresente bom desempenho, corre-se o risco de não dispor der forragem para os animais na seca.

Para assegurar melhor distribuição gradativa durante a estiagem e reduzir problemas com florescimento, a Embrapa Gado de Leite recomenda plantar metade da área com variedades precoces e outra metade com variedades médias e tardias.

Normalmente, as variedades usadas na alimentação do gado são destinadas à indústria, mas já existem programas de melhoramento genético de cana para fins forrageiros. Deste trabalho resultou o lançamento, em 2002, da variedade IAC 862480, com hábito de crescimento ereto, bainha aderida fracamente ao colmo (facilitando a desfolha natural), e uma boa relação entre o teor de fibra e a quantidade de açúcar.

O uso da IAC 862480 resultou no aumento de 17% no ganho de peso do gado, em comparação com a variedade RB 72454. Essa cana tornou-se vantajosa por ter um crescimento acelerado e boa relação entre teor de fibra e açúcar.

Faça uma boa adubação

Para que uma lavoura de cana-de-açúcar desempenhe um bom papel durante a seca e atenda a demanda alimentar do rebanho bovino, a Embrapa Gado de Leite recomenda que o produtor rural cultive na propriedade, em média, 2,5 hectares para cada cem bovinos.

O plantio deve ser feito nos meses de outubro e novembro (época das chuvas) para garantir cana na próxima estiagem (que geralmente vai de abril a setembro), com produção menor, mas já disponível. Mas é na seca do ano seguinte que o canavial apresentará produção plena de forragem.

No plantio, o produtor deve fazer covas com espaçamento de 1,20 m e usar de três a quatro toletes do colmo de cana com três a quatro gemas por cova. Para o plantio de um hectare são necessários de 8 a 12 toneladas de colmos ou cerca de mil metros quadrados de viveiro.

Adubação

Para solos de fertilidade mediana, a Embrapa Gado de Leite recomenda distribuir duas toneladas de calcário por hectare, com dois meses de antecedência ao plantio e, no sulco, antes de deitar os colmos,aplicar esterco de gado ou 400 kg/ha de NPK, na fórmula 052520. Três meses após o plantio, aplicar em cobertura 110 kg de uréia ou 250 kg de sulfato de amônio por hectare.

Para garantir boa persistência do canavial, fazer adubação de cobertura após cada corte, usando a fórmula 201020, na base de 400 kg por hectare, no início das chuvas. Se o canavial não for muito grande, a aplicação de esterco de curral é altamente recomendável.

Segundo os estudos da Embrapa Gado de Leite, o tamanho da área plantada deve levar em consideração a queda da produção do canavial. Habitualmente, a cana-de-açúcar produz um bom volume de massa, em média, por quatro anos.

Os estudos apontam que uma plantação de cana com o solo bem corrigido pode produzir de 60 a 120 toneladas de forragem por ano. Até 1.200 quilos por hectare no primeiro ano de corte, caindo gradativamente e podendo chegar a 60 toneladas por hectare no quarto ou quinto ano, quando o canavial deverá ser replantado.

Preparo pode ser diversificado

A fórmula usada por Geraldo Maia para oferecer a cana a seu rebanho é tida como a mais tradicional, com adição de uréia, sulfato de amônio e ração balanceada, normalmente à base de farelo de arroz, algodão ou soja e milho ou sorgo triturado.

As proporções desses suplementos à cana, recomendadas pelos pesquisadores da Embrapa Gado de Leite, são de adição de 8,5% de uréia e 1,5% de sulfato de amônio mais 15% de ração balanceada para cada quantidade de cana triturada.

No entanto, existem outras maneiras de se preparar a cana-de-açúcar para ser usada na alimentação do gado. Uma dessas fórmulas é a cana hidrolisada, desenvolvida para melhorar a digestão dos compostos pelos animais. De acordo com

estudos da Embrapa Gado de Leite, para cada quilo de cana triturada deve-se adicionar quatro gramas de soda cáustica, que precisa ser diluída em água e pulverizada na forragem no momento em que é triturada.

No entanto, a pesquisadores da Embrapa alertam que a soda cáustica precisa ser ministrada com cuidado e precisão por se tratar de uma substância extremamente corrosiva. Seu manejo inadequado pode implicar em danos aos bovinos e prejuízos a propriedade.

Pelas complicações que podem advir da má utilização da soda cáustica na alimentação das matrizes, o CTZL sugere outra forma de hidrolisar a cana. Segundo Moacir Saueressig, uma das alternativas é a adição de cal virgem.

No caso da cal, deve-se pulverizar a cana triturada com 1% de cal diluída em água. Essa mistura é 10% menos eficaz que a soda, entretanto, o uso da cal virgem pode ser até nove vezes mais barato que o da soda.

Saccharina

Outra forma de preparo da cana para alimentar o gado é a da saccharina, desenvolvida em Cuba. Segundo estudos difundidos sobre este preparo, ele pode aumentar o nível de proteína da mistura de cana com uréia em cerca de 11% a 16%.

Para preparar a saccharina, para cada tonelada de cana triturada, é preciso adicionar 15 quilos de uréia, 5 quilos de uma boa mistura mineral (encontrada em casas do ramo) e

2 quilos de sulfato de amônio diluídos em água e misturados à cana triturada.

Para que o processo de produção da saccharina seja realizado em boas condições, é preciso que a cana tratada e triturada seja distribuída em um ambiente bem ventilado e com piso revestido, em camadas de 5 a 10 cm. Feito isso, ela fica coberta por uma lona e entra em estado de fermentação (por no máximo 48 horas), para então ser servida ao animais.

A saccharina também pode ser estocada, mas para isso, é necessário manter a mistura em ambiente seco (com umidade de no máximo 15%). Segundo os estudos da Embrapa Gado de Leite, a saccharina bem seca pode ser estocada por até seis meses sem perder seus valores nutricionais.

Termômetro das usinas

O Brasil possui tradição na produção de cana, tanto para a fabricação de açúcar quanto para

a de álcool. Atualmente, o Brasil vive um momento eufórico na produção de biocom-bustíveis e expansão de usinas de cana-de-açúcar para todo o País, graças às crescentes altas do preço do petróleo.

Segundo o assessor-técnico da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, Saulo Queiroz, os pecuaristas que possuem pequenas plantações de cana em suas propriedades também podem ser um termômetro para novas usinas.

"Em todo o Centro-Oeste, os engenheiros agrônomo das usinas de cana procuram o pecuaristas para conhecer quais as variedades de cana plantadas em suas propriedades", afirma Saulo Queiroz.

O assessor-técnico explica que esta é uma forma de descobrir se o solo de determinada região é produtivo o suficiente para implementar uma usina. "Nenhum pecuarista planta só uma variedade de cana e isso facilita o trabalho dos pesquisadores", garante Queiroz.

Com ou sem etanol, é aconselhável que todo fazendeiro que tenha gado em sua propriedade, tenha alguma área de cana para assegurar a produção dos animais durante a estiagem. Caso o contrário, a melhor forma de manter os bovinos na seca é recorrer à implantação de silagem de milho ou sorgo. (Fonte: Jornal de Brasília)
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