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Reportagem Especial Sábado, 08 de Maio de 2010, 10:34 - A | A

Sábado, 08 de Maio de 2010, 10h:34 - A | A

Barato, serviço de \"guardadores\" de moto ganha confiança de condutores no centro da Capital

Marcelo Eduardo - Capital News

Dados da Polícia Militar registram que uma média de 20 motos por dia são roubadas ou furtadas em Campo Grande. Grande parte dos crimes não recebem solução ou o veículo não é recuperado, conforme a Delegacia Especializada de Furtos e Roubos de Veículos (Defurv).

A Cidade Morena possui uma frota de 84.018 motos, conforme o Departamento de Trânsito Estadual de Mato Grosso do Sul (Detran-MS). Devido ao baixo custo frente a um carro e a qualidade questionável do serviço transporte pública da Capital (considerado o que cobra uma das maiores tarifas no Brasil), este tipo de condução passou a ser preferência entre a população campo-grandense, principalmente para ir ao trabalho.

Diante do impasse em deixar a moto estacionada, de graça, em qualquer local– e correr o risco de perder o bem – e pagar caro (média de R$ 1,5 por hora) para ter o benefício de um estacionamento particular, os condutores preferem um serviço que começou como alternativa e já começa a se tornar padrão no centro de Campo Grande: os “guardadores” de moto.

O Capital News percorreu as principais vias do Centro e conversou com este pessoal que enfrenta sol e chuva para cuidar dos veículos em troco, às vezes, de poucas moedas.

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Sérgio de Souza trabalha desde 2006 cuidando as motos
Foto: Deurico/Capital News

Pilotar moto é perigoso, cuidar não

Sérgio Rocha de Souza, 28 anos, casou, se tornou pai e deixou o emprego de motoentregador.

Ganhava pouco mais que um salário mínimo, era obrigado a cumprir horário, tinha pouco tempo para curtir a família e corria riscos pelas vias de uma das cidades que possui um dos maiores índices de violência no trânsito – conforme o Detran-MS, foram 431 acidentes com vítimas envolvendo motos na Capital, somente em dezembro de 2009 (dado mais recente).

“Era perigoso, aqui, é mais tranquilo”, comenta.

Num dia de sol forte, e ainda quase na hora do almoço (momento em que na maioria das vezes a Capital parece ser um caldeirão), Sérgio se protege com um guarda-sol e se refresca com um tereré.

Sérgio cursa a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e tenta terminar o ensino médio. Procurou trabalhos em outros locais, mas, não foi a falta de oportunidade de ter carteira de trabalho assinada que o fez montar “ponto” numa das calçadas mais movimentadas da cidade.

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Como a amioria dos cuidadores, Sérgio protege os assentos com papelões
Foto: Deurico/Capital News

A flexibilidade para poder estudar e conviver mais de perto com a família o fez optar por ser, por enquanto, “guardador” de motos.

O “negócio” vem dando certo. Ele “tira” até mais de um salário mínimo em alguns meses. “Sou casado e tenho minha filhinha de dois anos. Com este trabalho, posso ter mais tempo para ficar perto delas. Chego aqui por volta das 10h e saio às 18h, depois, ainda vou para a EJA [imagine como não era corrida a vida de motoentregador, para ele se sentir com “tempo livre”...]. Quando eu era motoentregador, todo o mundo lá em casa ficava preocupado. E, aqui, uns não dão nada [dinheiro], mas, outros, dão cincão [cinco reais].”

Polícia e fiscalização não são problema, garante. “Eles entendem que a gente está trabalhando. Não cobramos nada, as pessoas dão o que elas querem. Se não derem nada, não vou ficar bravo. Não cobro. A fiscalização só pede para a gente não atrapalhar a passagem das pessoas na calçada, fora isso, é normal”, relata Sérgio, que está no local há cerca de 4 anos.

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Amarildo Contes chega a cuidar de mais de 30 motos em um dia
Foto: Deurico/Capital News

Confiança acima de qualquer coisa

Sérgio de Souza “guarda” as motos na Rua Barão do Rio Branco, quase na esquina com a Rua 14 de Julho – ponto de ferveção do comércio da cidade. Ali, na 14, Amarildo Contes, 23 anos, cuida das motos. A maioria dos condutores que deixam os veículos com ele são clientes antigos: em grande parte vendedores que trabalham na região.
“Chego a cuidar mais de 30 motos por dia. É puxado, mas, as pessoas confiam e eu procuro prestar um trabalho de qualidade. Cuidando dos capacetes também – algo que Sérgio também faz”, conta.

A confiança que Amarildo adquiriu após seis anos trabalhando com isso pode ser notada nas falas do freguês Edgar Viana, 29 anos. “Hoje, eu estacionei a moto, mas, tem dia – na verdade, a maioria das vezes – eu estou com pressa, paro na rua e entrego a chave para ele e ele mesmo estaciona. Eu entrego sem problemas porque sei que o trabalho é sério. Quando eu vou sair, ele está com a chave já – que eu deixei – e tira a moto para mim. É praticamente um manobrista. Serviço de luxo.”

O radialista de Rochedo vem a Campo Grande periodicamente. Sempre que passa pelo Centro deixa a moto com Amarildo. Ambos dizem que o costume é deixar dois reais ou três reais, mas, em dias especiais, como de festas de datas comemorativas, o dinheiro pode ser maior.

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Edgar Viana diz confiar pelnamente no "guardador": "Entrego as chaves na mão dele"
Foto: Deurico/Capital News

“Já tive problemas em estacionamentos pagos. Deixei lá uma hora e arranharam a moto. Isso não acontece aqui. Lá [estacionamento pago], a pessoa que fica cuidando não fica com o olho em cima da moto, então, logo vem outra pessoa [motociclista] e coloca a moto dele perto, ou bate quando vai sair, e acaba arranhando”, explica Edgar.

Laise Miranda também prefere deixar a moto com Amarildo. “Já deixei aqui outras vezes e confio no trabalho.” Ela estava apressada para um compromisso.

Amarildo também faz EJA e pretende prestar vestibular. Aliás, sua preferência por ser “guardador” também é pelo tempo disponível “para cuidar das coisas pessoais”. “Aqui, faço meu horário. Antes, era complicado para eu estudar quando trabalhava em outro lugar [formalmente].”

“Era moleque”

Pedro Alex Lacerda, 18 anos, chega às 8h30 à calçada em frente ao Banco Bradesco da Rua Marechal Cândido Mariano Rondon. Costuma sair às 17h, ou, enquanto estiver trabalhando para o último cliente do dia.

Diz que recebe cerca de um real a dois reais de cada condutor que deixa sua moto para ele cuidar. Mas, cobra R$ 20 de clientes fixos: a maioria, trabalhadores das lojas ou bancos da região.

Ele conta ao Capital News como iniciou o serviço. “Comecei cedo a trabalhar. Era moleque ainda, tinha 13 anos. Entregava panfleto. Tirava pouco para ficar um dia todo de baixo do sol. Aí, meu tio era dono dessa banca aqui [aponta uma revistaria que fica ao lado]. Então, ele falou que poderia ficar aqui cuidando das motos. E, hoje, estou com 18 anos.”

Pedro já chegou a empregar outra pessoa com o que ganhava. “Dá para tirar um salário mínimo hoje. Mas, já cheguei a ter um funcionário. Há uns dois anos ele preferiu sair, terminou o estudo e arrumou coisa melhor. Falei para ele ir, né? Ele tinha 19 anos, eu pagava R$ 10 por dia mais o almoço. A gente tem que procurar o que é melhor”, conta Pedro, que está completando o ensino médio, que cursa numa escola ali perto.

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Adeilson Batista aproveita a chegada dos condutores para oferecer água de coco
Foto: Deurico/Capital News

O trabalho de Pedro auxilia o de mais pessoas. O vendedor de água de coco Adeilson José Batista, 29 anos, aproveita a freguesia de Pedro e aumenta as vendas. Ele montou a barraca bem em frente ao estacionamento das motos. “A maioria [dos compradores] são clientes do banco, o pessoal que paga conta aqui na banca de revistas, a maior movimentação é nos dias de pagamentos de contas e de recebimento de salários. Mas, o pessoal da moto ajuda sim a aumentar o fluxo.”

Adeilson conta que sofreu um “problema na coluna” e precisou sair do emprego numa distribuidora de leite. “Parei, vendi o carro e comprei o carrinho [de água]”, conta. O dinheiro conquistado ali ajuda a esposa. “Ela estuda Pedagogia numa universidade particular. Com o trabalho dela, quase que só dá para pagar a faculdade, que acho que é cerca de R$ 490.”, relata.


Por: Marcelo Eduardo – (www.capitalnews.com.br)

 

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