Luciano Buligon, ex-prefeito de Chapecó (SC), tem atuado em sintonia com os interesses da J&F, holding dos irmãos Batista, para impedir a consolidação da venda da Eldorado Celulose à empresa Paper Excellence. A movimentação mais recente envolveu uma tentativa de pressionar o juiz João Paulo Morreti de Souza, da 1ª Vara Federal de Lages (SC), a se manifestar sobre o conflito de competência que tramita no Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília.
Buligon é autor de uma Ação Popular que tenta anular a venda da Eldorado com base na legislação que restringe a aquisição de terras rurais por estrangeiros. A iniciativa dele foi judicializada dois anos atrás e surgiu após o fracasso da J&F em reverter, por meio de arbitragem, a operação de venda da Eldorado para a Paper, concluída ainda em 2017.
A pressão judicial se intensificou no final de fevereiro, quando Buligon protocolou duas petições, com menos de 48 horas de intervalo, cobrando do juiz catarinense uma posição formal sobre a disputa entre as ações que tramitam em Chapecó e em Três Lagoas (MS). O município sul-mato-grossense é sede da fábrica da Eldorado e onde tramita a ação original do caso, movida por um cidadão do local.
Na petição, Buligon ainda pediu ao ministro Gurgel de Faria, relator do conflito no STJ, que intime o magistrado de Santa Catarina a se pronunciar. "Se o Juiz de Santa Catarina reconhecer a competência do Juízo da 1ª Vara Federal de Três Lagoas/MS, não haveria necessidade do julgamento no STJ", argumentou.
A tentativa de interferência chamou atenção por ter sido apresentada apenas três dias depois de a própria J&F protocolar uma solicitação com o mesmo teor na Corte. A proximidade entre os movimentos reforça a suspeita de articulação conjunta entre o ex-prefeito e os controladores da JBS.
Na prática, a manobra visa esvaziar o julgamento do conflito de competência no STJ, que pode consolidar a jurisdição da Justiça Federal de Três Lagoas sobre a disputa, contrariando os interesses da J&F. O grupo empresarial tenta há sete anos barrar judicialmente a venda da Eldorado, mesmo após a derrota no processo arbitral.
Apesar da pressão, o juiz João Paulo Morreti de Souza manteve a suspensão do processo em Lages, em decisão publicada no último dia 5 de março. “Caso este magistrado profira decisão manifestando-se acerca da competência, estará descumprindo a decisão proferida pelo STJ”, escreveu o juiz, citando a determinação de suspensão imposta pelo ministro Gurgel.
Em dezembro de 2024, o relator do STJ destacou que permitir o prosseguimento de ações idênticas em duas jurisdições distintas poderia gerar "soluções distintas e até inconciliáveis", colocando em risco a segurança jurídica do processo.
A atuação de Buligon levanta dúvidas sobre a real motivação da ação popular que move, especialmente após o juiz da 2ª Vara Federal de Chapecó se declarar impedido por ser casado com a advogada do ex-prefeito. A condução do processo passou então à 1ª Vara de Lages.
A J&F, por sua vez, justifica as investidas como sendo em prol da “economia e celeridade processual” — discurso que contrasta com a estratégia de prolongamento judicial adotada desde a assinatura da venda da Eldorado. A Paper Excellence, por sua vez, já teve a legitimidade da operação reconhecida em arbitragem internacional.
Enquanto isso, a definição sobre quem será o dono efetivo da Eldorado continua travada em um emaranhado de disputas judiciais e interesses cruzados, com impactos diretos sobre o setor de celulose no Brasil.