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Opinião Domingo, 23 de Março de 2025, 18:15 - A | A

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Opinião

A aliança (im)provável entre Ciro Gomes e Ronaldo Caiado

Por João Batista M. Prates

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Os recentes acontecimentos da política brasileira vão clareando, cada vez mais, a situação eleitoral de 2026, que promete uma disputa presidencial das mais acirradas da história. De um lado, Lula esfarela-se no ar à medida em que sua popularidade cai e exauriu-se qualquer possibilidade de mudança substancial na materialidade de vida dos brasileiros no curto prazo. Como tentativas desesperadas, e com um atraso de 15 anos, finalmente entrega às mãos do congresso nacional a proposta de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até 5 mil reais mensais, e acena com a ressureição da proposta de fim da escala de trabalho 6x1, a mesma que há alguns meses o Governo fez questão de ver morrer lentamente nos corredores do Castelo democrático, uma vez que estes apelos se apresentam como tábua de salvação para a reeleição. Sem espaço fiscal para fazer mais gastos públicos, Lula procura abrir espaço para um novo ciclo de endividamento nacional, reformulando as regras para concessão de crédito consignado, descontado em folha, com seguro do Tesouro contra a inadimplência – como denunciou recentemente Ciro Gomes, quebrando o silêncio a que se impôs e que durava já vários meses (ao menos fora da sua “newsletter”). É pouco provável que estas medidas consigam reverter a tendência de queda de sua popularidade e Lula chegue em 2026 enfraquecido. O último golpe em sua esperança de reeleição foi dado pelo Supremo Tribunal Federal, que avança a passos largos para colocar Bolsonaro na cadeia, exterminando a hipótese de deixa-lo concorrer para reeditar a grande coalisão nacional da “democracia” contra o “fascismo”, em benefício de Lula.

Na esteira deste cerco do STF, vemos a figura proeminente, arquiteto mesmo do bolsonarismo, Carlos Bolsonaro, refugiar-se preventivamente nos EUA, após Valdemar da Costa Neto ter supostamente barrado sua indicação para a Comissão de Relações Exteriores da Câmara Federal, o que era a última tentativa do bloco radical do “bolsonarismo raiz” de se distanciar do Centrão e recolocar a polarização em termos extremados, na campanha antecipada de Jair Bolsonaro, para fazer como Lula fizera em 2018, deixando sua base acreditar até o último segundo que ele seria candidato. Valdemar, pelo contrário, percebe a derrota iminente e não acolhe a estratégia suicida; acenando ao centro, o caminho fica cada vez mais livre para a candidatura de Michele Bolsonaro, que recentemente estreou em grande estilo sua campanha com uma entrevista ao jornalista Alexandre Garcia, com números muito relevantes de visualizações. Embora seja figura muito mais capaz de manobrar ao centro e suavizar a imagem do dito bolsonarismo, é questionável se Michele terá amplos arcos de aliança com partidos do Centrão para além do minúsculo PR, sobretudo com a cada vez mais provável Federação partidária entre o PP e o União Brasil, já anunciada. O PL tentará atrair o PSD em 2026, com a mediação de Tarcísio – Bolsonaro não cansa de anunciar a estreita relação mantida com o governador Ratinho do Paraná. A ver se o esforço redundará em sucesso. Dado o histórico do partido e as conversas entre Lula e Rodrigo Pacheco que envolvem o Governo de Minas Gerais, é provável que o PSD se divida e libere suas bases para apoios variados e paradoxais, segundo a lógica de cada estado, como tem sido a tônica da história do partido. Em posição similar ficará o MDB, tudo indica, e mesmo se o PT oferecer à Simone Tebet o lugar de Alckmin na chapa de 2026, dando ao PSB o consolo do apoio para o Governo de São Paulo numa batalha perdida com a reeleição provável de Tarcísio (inclusive se for o próprio Alckmin o candidato, embora esta remota alternativa fosse oferecer maior dificuldade ao atual governador do estado. A ver).

A grande novidade, contudo, parece ser a candidatura de Ronaldo Caiado, que desponta como capaz de ganhar corpo, seja com o apoio anunciado de Gustavo Lima, seja com o reforço do PP em uma federação que criaria o maior partido do país em número de deputados, estrutura partidária e capilaridade. Caiado será o centro de gravitação a puxar para junto de si o agonizante PSDB, queimando a largada e se apresentando como candidato de conciliação e união nacional com muita antecedência (o show está marcado para Abril). Sendo ainda uma figura desconhecida da maior parte do país, a crescente exposição da sua imagem e os imensos recursos materiais para a sua campanha podem pender a balança da disputa, uma vez que ele é carismático, experiente e será reconhecido pelo eleitorado como um governante de pulso firme, capaz de exercer autoridade. Ora, este traço é característico do Bolsonaro, abrindo um flanco no eleitorado cativo de Michele de maneira semelhante com que ela própria abre um flanco no eleitorado de Lula, com o seu discurso em favor da inclusão, suas obras de caridade e sua condição feminina que já estão sendo explorados à exaustão. Faltaria a Caiado justamente o apelo à esquerda, que só pode ser fornecido por Ciro Gomes. Daí minha intuição de que a candidatura Caiado vá cortejar, cada vez mais, Ciro Gomes daqui em diante. E Ciro deveria deixar-se ser cortejado e corresponder aos acenos vindouros de Caiado. Deveria mesmo busca-los ativamente, uma vez que Caiado é o único candidato a concorrer, com chances reais de vitória, que tem grande vinculação com o mundo produtivo e com a economia real do país. A vitória de Caiado representará, potencialmente, o fim não só da polarização superficial que esteriliza o país, mas também o fim da hegemonia liberal-fiscalista, recolocando o Estado brasileiro na condição de indutor e fomentador do crescimento econômico planejado. Em outras palavras, Caiado seria a pá com que Ciro Gomes retiraria o entulho que tem estagnado a vida brasileira há já três décadas. Há inúmeros desafios para esta união pragmática, mas antevejo que haverá uma figura central a operá-la. Trata-se de Aldo Rebelo, detentor de grande respeito e simpatia de Ciro Gomes. Sua vinculação com o Agronegócio certamente o fará pender para a defesa da candidatura de Caiado, e o seu diagnóstico de que Caiado necessita de uma entrada à esquerda para compor uma ampla coalisão fará, tudo indica, com que seja a ponte de ligação entre Ciro e esta candidatura, certamente sustentada em compromissos públicos assumidos por Caiado em política econômica. O que sobra é tempo para formulá-los e anunciá-los, nesta sua campanha antecipada. Há que buscar a construção desta aliança, ativamente, o quanto antes.


*João Batista M. Prates
Mestre em Filosofia (UNIFESP, 2022); especialista em Ensino de Sociologia (UFMS, 2022), em Gestão e Controle Social das Políticas Públicas e em Direito Público Municipal (EGC-TCMSP, 2021 e 2023). Possui pós-graduação em Legislativo, Controle Externo e Políticas Públicas no Brasil e em Legislativo, território e Gestão democrática da cidade (EP-CMSP, 2020 e 2023).

 

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