A Delegacia de Atendimento à Mulher do município de Naviraí tomou conhecimento, na semana passada, do relato de uma criança que informou fatos que configuravam, em tese, os delitos de tortura qualificada e exposição da vida e saúde à risco. Delitos, em tese, praticados nas dependências de uma creche.
A criança relatou que não fora vítima dos crimes, contudo, presenciou a proprietária, que também era cuidadora do espaço, agredir bebês, batendo suas cabeças contra o sofá e colocando pano na boca de uma delas para que não chorasse quando a cuidadora queria assistir seriado na televisão. Contou, ainda, que ela dava remédios para as crianças dormirem quando estavam chorando.
Diligências investigativas foram realizadas e houve a necessidade da Delegacia de Polícia representar pela medida de interceptação/captação ambiental no referido do estabelecimento. Com o deferimento da medida, os equipamentos foram instalados pela equipe do Departamento de Inteligência da Polícia Civil e o monitoramento por áudio e vídeo deu-se início às 6h de segunda-feira (10 de julho).
No final da manhã, a investigada, de 30 anos, agrediu fisicamente uma bebê de 11 meses. Pelo monitoramento em tempo real verificou-se que a bebê estava em um colchão no chão, sozinha, e havia saído do travesseiro que estava. A investigada, brutalmente tirou a criança do colchão e a jogou no local em que estava.
Em seguida a bebê voltou a chorar, possivelmente por estar incomodada por fome, necessidade de trocar fraldas ou por estar cansada de ficar no mesmo lugar por muito tempo, momento em que a investigada novamente a pegou e jogou no colchão e também desferiu alguns tapas no corpo da bebê, nitidamente como castigo em virtude do choro.
Segundo as informações da Polícia Civil, como eram captados imagem e som, foi possível ouvir a investigada chamar a bebê de sem-vergonha e dizer que quando a menina começasse a andar estavam lascadas. Imediatamente uma equipe foi ao local para intervir, enquanto outra equipe permaneceu analisando as imagens.
A equipe de investigadores estranhou o fato da bebê não se levantar do colchão e permanecer no local por horas, sem se arrastar, engatinhar ou andar, aparentando estar sob efeito de algum medicamento, pois seria normal que um bebê com 11 meses fosse agitado.
Em uma das imagens foi possível ver que uma funcionária, de 26 anos, ministrou algum medicamento na mesma bebê, que dormiu por horas. Pelas imagens, tanto a proprietária como a funcionária, ambas cuidadoras no estabelecimento, ficaram por muito tempo sentadas, mexendo no celular, sem olhar efetivamente as crianças que lá estavam.
No local a equipe também constatou que havia mais crianças, algumas estavam com fome e foram alimentadas pelos policiais. A perícia criminal foi acionada, apreendeu-se o medicamento ministrado pela cuidadora, o qual é utilizado para tratamento de sintomas de enjoo, tontura e vômitos, podendo causar sonolência, havendo a descrição na embalagem e na bula quanto a proibição ao uso por crianças menores de 2 anos. O Conselho Tutelar foi acionado e as crianças foram entregues aos responsáveis. A bebê de 11 meses passou por exame de corpo de delito, em que foi constatado pela perícia médica que a criança apresentava edema em região malar esquerda e lesão bolhosa em face medial do terço médio do pé esquerdo. Foi possível perceber, ainda, sofrimento mental, esse ainda pior, pois não deixou marcas visíveis, já que a criança era xingada e menosprezada pela cuidadora, que após torturá-la, a deixava chorando sozinha.
A proprietária do local, de 36 anos, foi presa em flagrante pelo crime inafiançável de tortura, além de lesão corporal, exposição ao risco e dopagem.
Ela nega que tenha dopado as crianças e afirma que o medicamento apreendido era para consumo próprio, mas que os pais a autorizavam a ministrar medicamentos.
A outra cuidadora, de 26 anos, foi ouvida e responde em liberdade. Ela é investigada por omissão ao crime de tortura e havendo indícios a polícia vai representar contra a mesma.