![Fale Artuzi; nós temos o direito de saber](https://cdn.capitalnews.com.br/system/fotosArtigosColunistas/D20100316_H133958_ID.jpg)
Prefeito de Dourados Ari Artuzi
“Nós vamos derrubar gente grande. Ou eles param com isso, ou nós vamos derrubar todos” disse Ari Artuzi, o Prefeito de Dourados, em recente entrevista de rádio, indignado com o que classifica como “perseguição do pessoal do GAECO”.
Como a mídia do estado dedicou um silêncio sepulcral ao fato, a frase do prefeito foi engavetada no arquivo do esquecimento. Entretanto, não há como fugir de uma singela conclusão: trata-se de uma ameaça. A quem é destinada, não se sabe. “Gente grande” é uma expressão vaga demais e não vai além de insinuações, porém a conclusão óbvia de um “torpedo” deste calibre é que o Prefeito tem poderosas informações ou provas guardadas no colete e está se escorando nelas, por meio de ameaças, para intimidar pessoas.
Se o Prefeito tem respeito pelo povo e interesse em defender a sua biografia, ele tem a obrigação moral de dizer tudo o que sabe, sobretudo agora que confessou publicamente ser detentor de informações capazes de derrubar “gente grande”. Pode ser que não as diga, por não ter provas, mas neste caso fará o papel de um jogador inconseqüente: um “blefador” desastrado.
O silêncio da mídia e da classe política sobre um assunto não nos convence de que se trata de tema irrelevante; ao contrário, a relevância de um tema pode ser medida pelo tamanho do silêncio... pois há silêncios derivados do desprezo pela desimportância e silêncios costurados pela cumplicidade dos que temem ser atingidos pela revelação daquilo que se quer acobertar pelo esquecimento do público.
Ari Artuzi disse claramente que tem informações que podem derrubar gente grande. Por que então ele não fala? Por que então ele não convoca uma entrevista coletiva e põe as cartas na mesa, nominando “gente grande”, apontando os fatos e revelando as circunstâncias?
Ora, Artuzi é empregado do povo. Seu mandato é do povo. Sua eleição se deve ao povo. Ao falar de “gente grande”, Artuzi está insinuando que o povo foi, é e está sendo vítima de condutas imorais e criminosas de “gente grande”, logo se continuar em silêncio, mesmo sabendo que o povo foi ou continua sendo vítima de “gente grande”, conclui-se que, na verdade, o prefeito está se lixando para o povo, pois o que quer mesmo é salvar a própria pele através de ameaças.
Este comportamento egoísta e antirrepublicano é incompatível com quem pretende governar um povo com espírito público dentro de aceitáveis padrões éticos. Na verdade, aparenta gesto de quem lida com delinqüentes, pois quem transforma a inocência em objeto de ameaça, inocente não é, mas culpado que pretende, através de chantagem mal disfarçada, transmitir o seguinte recado: “ou vocês me protegem, ou vamos todos morrer abraçados...”
É triste, trágico e profundamente decepcionante constatar que a política está incorporando as piores e mais nocivas práticas e comportamentos. A linguagem, os gestos, os costumes, as intenções, quase tudo parece que está contaminado pela lógica da transgressão moral, legal e das intenções ocultas. Deveria ser o mundo dos mais fortes de virtudes; mas se revela o mundo dos mais fortes de vícios e defeitos.
Enquanto não se reformar profundamente o sistema eleitoral e político brasileiro, os mandatos – em sua grande maioria - serão exercidos pelos espertalhões, pelos ladravazes, pelos demagogos, pelos dissimulados e maus. Pode até parecer ingenuamente metafísica ou reducionista a seguinte percepção: na política, o mau está se sobrepondo ao bom; o mal está superando o bem; o ódio está mais forte que o amor; a falsidade está sobrepujando a sinceridade; a mentira está acima da verdade; o vício está mais atuante que a virtude. Será o retrato da sociedade? Não creio, mas ainda que isto fosse verdadeiro, o papel do político é justamente o oposto: transformar o mundo para melhor, jamais piorá-lo.
Exemplo vivo de que a atividade política está se deteriorando é o episódio de que trata este artigo: um prefeito ameaça autoridades poderosas do meio político com a mensagem da intimidação a confessar ciência de fatos gravíssimos que, se revelados, derrubariam todos eles.
Enfim, se o prefeito nada disser e deixar tudo como está, vestirá a capa do cúmplice por omissão, pois servidor público que tenha conhecimento de crime e se omite, comete crime também. Se ele disser, mas não provar, fará papel de um caluniador. Se falar e provar, será Herói, desde que esteja imune aos efeitos da delação. Agora, se confessar que mentiu ou falou embalado pela emoção e pedir desculpas ao povo, será condenado com a atenuante política da comiseração popular.
Portanto, a palavra está com o Prefeito Ari Artuzi!
Fábio Trad – Advogado, Professor Universitário e ex-Presidente da OAB-MS (2007-09)