Ao longo dos últimos trinta e três anos, os Tribunais de Contas fazem um percurso de contínua e concreta afirmação da relevância ampliada que o constituinte de 1988 lhes atribuiu.
Como instituição republicana essencial, nas três esferas – municipal, estadual e federal – em que atua no controle externo, o Tribunal de Contas exerce responsabilidade constitucional inderrogável de zelar, com rigor, não só pela correta aplicação do erário, mas também pela garantia de efetivo retorno dos investimentos públicos em benefício da sociedade.
Significa dizer que, para as Cortes de Contas, a estrita obediência, pelos gestores públicos, aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência – apropriadamente conhecidos como LIMPE – é pressuposto para assegurar não só a higidez da governança em si mesma, mas a qualidade da aplicação dos recursos em obras e serviços que respondam às reais demandas da coletividade.
Neste sentido, a relevância da eficiência se dá na medida em que esse princípio, embora não transcenda aos demais, tem o condão de materializar, de tornar efetivo o resultado virtuoso da convergência de todos os primados que regem a administração pública como expressão legítima das aspirações do cidadão.
A correta compreensão da eficiência como princípio de governança pública dispensa teorizações complexas, bastando observar que o gestor deve oferecer o melhor serviço à população, otimizar os recursos públicos e evitar o desperdício, além de garantir atendimento satisfatório e em tempo razoável às expectativas da sociedade.
Obviamente, se descurar da legalidade, da impessoalidade, da publicidade ou da moralidade, a gestão pública, seja nos municípios, nos estados ou no país, não terá como alcançar a eficiência exigida. E por aí estará irremediavelmente comprometido o fundamento seminal da República (res publica, do latim ‘coisa pública’). E, com ele, a própria essência da democracia representativa.
Compete, naturalmente, aos Tribunais de Contas, como atribuição constitucional, a responsabilidade ética e política de fiscalizar o cumprimento desses cinco princípios que fundamentam a administração pública. E dos quais deriva todo um conjunto de procedimentos que balizam a via a ser seguida por administradores que não pretendam deslegitimar a delegação popular que lhes confere mandato.
Como instituições auxiliares do Poder Legislativo – mas sem qualquer subordinação hierárquica ou administrativa a ele – na preservação da legalidade, da legitimidade e da economicidade na utilização dos recursos públicos, os Tribunais de Contas se confirmam crescentemente como guardiães da boa governança. Suas prerrogativas constitucionais lhes delegam, pela natureza fundamental das correspondentes atribuições, protagonismo intransferível na construção permanente de uma cidadania cada vez mais consciente de seus direitos.
A Constituição de 1988 conferiu aos Tribunais de Contas relevância e protagonismo correspondentes à nova realidade político-institucional estabelecida no próprio texto constitucional. Em um contexto em que se restabeleceu a plenitude dos valores democráticos, a Carta Magna “ampliou e acrescentou, significativamente, a abrangência e a qualidade, mais diversificada, das competências dos órgãos de controle externo”, no dizer do então ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Luciano Brandão de Souza (De Souza, 1989, p.45).
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Ao longo dos últimos trinta e três anos, os Tribunais de Contas fazem um percurso de contínua e concreta afirmação dessa relevância ampliada que o constituinte de 1988 lhes atribuiu. Nesse processo, as Cortes de Contas qualificam-se continuamente para responder às novas exigências que as profundas transformações sociais e os avanços tecnológicos imprimem na governança pública.
A propósito, em recente artigo o presidente eleito da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), Cezar Miola, ao tratar das “competências ampliadas” dos órgãos de controle externo observa que, com a CF de 1988, “surgiram possibilidades inéditas”, como a de avaliar “o impacto de programas governamentais e de políticas públicas na melhoria da vida das pessoas”. A seu ver, “nessa verdadeira prestação de serviços, os TCs reforçam sua própria legitimidade”.
Como temos sublinhado com frequência neste espaço, os Tribunais de Contas são atores institucionais cada vez mais importantes no processo de modernização estrutural e política da administração pública, na medida em que, sem transigir com suas atribuições originais, asseguram a transferência de Conhecimento para qualificar os agentes e administradores jurisdicionados.
Ao privilegiar, pela capacitação permanente de gestores, a prevenção de danos e a otimização dos investimentos públicos, ao mesmo tempo em que disponibiliza suportes que estimulam o controle social sobre a governança pública, os Tribunais de Contas exercem papel preponderante na consolidação da democracia.
*Iran Coelho das Neves
Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul.
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